Por César dos Santos Moreira*
Dalgiza Andrade Oliveira**
O desenvolvimento sustentável é um conceito sistêmico que traduz o equilíbrio entre o desenvolvimento ambiental, econômico e social, de modo a suprir as necessidades materiais no presente, sem o comprometimento das necessidades num contexto futuro (FEIL; SCHREIBER, 2017). A Figura 1 - expressa o entrelaçamento de interesses para que haja o equilíbrio necessário à sustentabilidade do planeta.
Figura 1 - Conceitos constituintes do desenvolvimento sustentável
Fonte: Instituto de Formação e Ação em Políticas Sociais - Silva, Casoni e Goes (2018) Numa perspectiva holística, o tripé da sustentabilidade (Figura 1) é um aspecto essencial ao desenvolvimento, portanto, demanda a compreensão de como se almeja o futuro, alinhando a sociedade, o meio-ambiente e a economia. Para além desse entrelaçamento conceitual, entende-se como emergente a participação equitativa entre os governos, as instituições e os sujeitos, num movimento integrativo a fim de se alcançar o almejado equilíbrio.
Da perspectiva dos sujeitos, esse debate está revestido de uma maior importância, haja vista que sem a participação e inclusão das pessoas não se pode falar em desenvolvimento. Reflete-se que apesar da popularização das tecnologias da informação e comunicação (TIC) e das mídias sociais, característica da chamada sociedade da informação e do conhecimento (DZIEKANIAK; ROVER, 2011), ainda se depara com o contraste em relação ao acesso à informação pelas populações dos países periféricos, perspectiva básica ao desenvolvimento. Segundo Dziekaniak e Rover (2011), esses conceitos denotam o uso compartilhado de recursos, na construção coletiva de conhecimento, na interação livre de restrições de espaço e tempo e, na valorização do direito à informação, às TIC e à educação, como um bem comum. A fim de contribuir com esse debate no cenário internacional, a Organização das Nações Unidas (ONU) promoveu uma série de conferências e firmou pactos entre os países para a construção de uma agenda global. A primeira carta de intenções fruto das discussões da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92), a Agenda 21, foi dedicada à promoção de um novo padrão de desenvolvimento para o século XXI alinhado às questões ambientais (DZIEKANIAK; ROVER, 2011).
O segundo movimento internacional abarcou as discussões acerca do desenvolvimento humano em contrapartida ao progresso, numa série de cúpulas multilaterais realizadas durante os anos 1990. Como resultado, em 2000 foi anunciada a Declaração do Milênio, a qual compreendeu os Objetivo de Desenvolvimento do Milênio (ODM), bem como estabeleceu o compromisso dos Estados-membros da ONU para o enfrentamento aos principais desafios sociais no início do século XXI, entre outros, a redução da extrema pobreza no mundo (Figura 2).
Figura 2 - Objetivo de Desenvolvimento do Milênio (ODM)
Fonte: Plataforma Agenda 2030 (2015)
Com a proximidade do período limite para a implementação dos ODM, a partir de 2010 iniciaram-se as discussões em torno de uma nova agenda de desenvolvimento para os anos pós 2015 (Figura 3). Por intermédio do documento O Futuro que Queremos, produto da Conferência sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) organizada pela ONU em 2012, lançou-se as bases para uma nova agenda, em vista da necessidade de formulação de novos objetivos e metas globais em direção ao desenvolvimento sustentável.
Figura 3 - Construção de uma agenda global pós-2015
Fonte: Plataforma Agenda 2030 (2015)
Os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) foram construídos por especialistas da ONU, da sociedade civil e da comunidade científica de 70 países, considerando-se as demandas e questões debatidas nas conferências até então realizadas. O documento Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável adotado em 2015 pela Assembleia Geral da ONU, popularmente conhecido como Agenda 2030, consiste em 17 ODS subdivididas em 169 metas. Esses objetivos e metas são a base de orientação para a construção de políticas nacionais e para as atividades de cooperação internacional entre governos, organizações e pessoas na perspectiva de um caminho para um mundo mais sustentável até 2030.
A Agenda 2030, para além das perspectivas econômicas acerca do desenvolvimento, enseja indagações humanas e sociais relevantes para o entendimento da realidade, sobretudo, acerca da convergência entre os papeis de governos, organizações e pessoas frente à sustentabilidade político-social, econômica e ambiental. A Agenda conduz a uma questão de relevância reflexiva para toda a sociedade: “como equilibrar a lógica do desenvolvimento com as lógicas ambiental e humana?”
Em face de construção e compromisso com essa Agenda, entende-se que o acesso à informação é uma dimensão essencial ao desenvolvimento sustentável, principalmente, para os sujeitos, haja vista os desafios e demandas presentes na atualidade. Salienta-se que a informação tudo perpassa, desde a vida doméstica à vivência profissional, seja consumindo ou comunicando. Depreende-se, pois, que tudo pode ser portador de informação, aspecto que a coloca num patamar essencial aos sujeitos, se o que se pretende é a sua participação no desenvolvimento.
Diante do exposto, da ótica do acesso à informação, algumas questões podem ser indagadas às bibliotecas: “Como podem contribuir para a efetivação das ações sociais presentes na Agenda 2030, rumo ao desenvolvimento? Quais estratégias informacionais podem adotar para o empoderamento das pessoas frente aos dilemas, desafios e demandas do desenvolvimento sustentável?”
O desenvolvimento sustentável requer reflexões das partes envolvidas em seu processo, considerando-se que desenvolvimento e sustentabilidade são conceitos contraditórios. Como lógicas que se contrapõem, o conceito desenvolvimento privilegia a exploração do planeta e o acúmulo, algo que confronta com a sustentabilidade humana e ambiental. Essa perspectiva reflexiva tem outra dimensionalidade com o acesso e consumo de informações significativas, aquelas capazes de transformação, autonomia e empoderamento. Essa assertiva vai ao encontro do posicionamento de Oliveira (2013, p. 3), quando afirma que:
[...] intimamente relacionado com a dignidade da pessoa humana, o acesso à informação de qualidade atua positivamente na proteção e no desenvolvimento de toda a coletividade, contribuindo para a realização de outros direitos, tais como o direito à saúde, educação, moradia, etc.
O reconhecimento do acesso à informação como meta fundamental ao desenvolvimento está incluso no Objetivo 16 - Paz, Justiça e Instituições Eficazes, que expressa o seguinte na Meta 16.10 - Assegurar o acesso público à informação e proteger as liberdades fundamentais, em conformidade com a legislação nacional e os acordos internacionais.
Nesse sentido, a Federação Internacional de Associações e Instituições de Bibliotecas (IFLA, 2015) ressalta que ao demonstrar sua contribuição em todas as metas, as bibliotecas estarão em melhor posição para estabelecer parcerias para implementar estratégias e programas nacionais que beneficiem os seus utilizadores, tendo em conta que o acesso à informação apoia todos os objetivos da Agenda 2030.
Assim, compreende-se como necessário às bibliotecas se distanciarem da sua “caixinha básica de ações”, limitada à comunidade usuária dos seus serviços, para ampliar suas possibilidades de atuação, principalmente, quando se almeja contribuir com o processo ora em curso, ou seja, as mudanças provocadas pelos ODS no horizonte temporal da Agenda 2030.
Referências
A AGENDA 2030 para o desenvolvimento sustentável. PLATAFORMA AGENDA 2030. Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento - PNUD; Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, 2015. Disponível em: http://www.agenda2030.com.br/. Acesso em: 20 abr. 2021.
DZIEKANIAK, G.; ROVER, A. Sociedade do Conhecimento: características, demandas e requisitos. DataGramaZero, [s. n.], v. 12, n. 5, out. 2011. Disponível em: https https://egov.ufsc.br/portal/conteudo/artigo-sociedade-do-conhecimento-caracter%C3%ADsticas-demandas-e-requisitos. Acesso em: 2021.
FEDERAÇÃO INTERNACIONAL DE ASSOCIAÇÕES E INSTITUIÇÕES DE BIBLIOTECAS. Conjunto de ferramentas: as bibliotecas e a implementação da Agenda 2030 da ONU. Haia (Holanda): IFLA, 2015. Disponível em: https://www.ifla.org/files/assets/hq/topics/libraries-development/documents/libraries-un-2030-agenda-toolkit-pt.pdf. Acesso em: 21 abr. 2020.
FEIL, A.; SCHREIBER, D. Sustentabilidade e desenvolvimento sustentável: desvendando as sobreposições e alcances de seus significados. Cadernos EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 14, n. 3, jul./set. 2017. DOI: https://doi.org/10.1590/1679-395157473. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/cebape/v15n3/1679-3951-cebape-15-03-00667.pdf. Acesso em: 23 abr. 2021.
OLIVEIRA, C. J. S. Garantia do direito à informação no Brasil: contribuições da Lei de Acesso à Informação. Rio Branco, 2013. p. 1-26. Disponível em: https://repositorio.cgu.gov.br/. Acesso em: 2021.
SILVA, J. O. da; CASONI, V. C.; GOES, J. P. R. Empresas sustentáveis: a importância da sustentabilidade para a filosofia coorporativa. BISUS - Boletim de Inovação e Sustentabilidade, São Paulo, v. 1, p. 1-49, 2018. Disponível em: https://www.pucsp.br/sites/default/files/download/bisus2018-vol1-empresas-sustentaveis.pdf. Acesso em: 20 abr. 2021.
Dados biográficos do autor
* Bibliotecário no Instituto Federal Minas Gerais (IFMG). Doutorando em Gestão e Organização do Conhecimento pela ECI - UFMG (2020-). Mestre em Ciência da Informação pela Escola de Ciência da Informação - ECI da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG (2018). Especialização em Docência pelo Instituto Federal de Minas Gerais, Campus Arcos - IFMG (2020), em Gestão Escolar pela Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP (2014) e em Educação a Distância pelo SENAC Minas (2007). Graduado em Biblioteconomia pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG (2002).
E-mail: cesarbib@yahoo.com.br/
** Professora Associada da Escola de Ciência da Informação (ECI)/Programa de Pós-Graduação em Gestão da Organização e do Conhecimento (PPGGOC) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Doutora em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCI) da UFMG (2011). Mestre em Ciência da Informação (PPGCI/UFMG-2005). Bacharel em Biblioteconomia (Escola de Biblioteconomia/UFMG-1991).
E-mail: dalgizamg@gmail.com
Lattes: http://lattes.cnpq.br/2803696275869287
Como citar
MOREIRA, C. S.; OLIVEIRA, D. A. O compromisso das bibliotecas com a agenda 2030: em pauta o acesso à informação. Ciência da Informação Express, [S. l.], v. 2, n. 5, 10 maio 2021. Disponível em: https://www.cienciadainformacaoexpress.com/post/o-compromisso-das-bibliotecas-com-a-agenda-2030-em-pauta-o-acesso-%C3%A0-informa%C3%A7%C3%A3o
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