por André P. Pacheco, Maria Cristina Vieira de Freitas, Carlos Guardado da Silva
Press Release
Quanto mais o contexto digital permeia as nossas atividades, desde a comunicação à saúde, maiores são o volume e a complexidade da informação produzida. Imagens, mensagens de áudio, vídeo e texto coexistem como formatos que permitem uma comunicação sem precedentes através do espaço e do tempo.
Quando a comunicação é facilitada, é dificultada a preservação. Se a tecnologia torna a produção, transmissão, manipulação, organização e manutenção dos documentos de arquivo mais fácil, barata e rápida, também lança novas ameaças na garantia da autenticidade, confiabilidade e acessibilidade no longo termo. Existe um “trade-off” inevitável entre menos integridade e menos durabilidade em favor de maior velocidade, comunidade e redução de custos.
Durante décadas, desde meados do século passado, os arquivistas e profissionais da informação têm batalhado - muitas vezes sem sucesso - com a questão de como garantir a autenticidade dos documentos digitais, um esforço crítico uma vez que “digital information is not subject to gradual decay: it either exists, or it does not” (UNESCO, 2007).
Não há segundas hipóteses, quando um documento digital se torna inacessível, quer devido a obsolescência do software ou hardware, não há modos de o recuperar. Quem não experimentou ainda aquele horror que se sente quando se sabe que o disco (que dantes era a cassete, a disquete, ou a pen) em que se tem o nosso trabalho de várias semanas ou meses vai à vida, e se perdeu tudo? A preservação digital é difícil, é imperdoável, mas também por isso é um desafio entusiasmante.
Neste contexto, destaca-se um achado do projeto InterPARES 2 que expressa que uma das melhores formas de garantir a autenticidade dos documentos digitais é por meio da sua descrição, criando metadados que possam servir para fornecer informações relevantes sobre o recurso, nomeadamente a sua identidade, o seu assunto, informações técnicas, bem como informações sobre o seu criador (DURANTI; BLANCHETTE, 2004).
Uma intrigante estrutura de descrição é o “FAIR Accessor”, proposto por Mark Wilkinson et al. (2017), um dos principais proponentes dos agora famosos princípios FAIR. Em fidelidade aos princípios, esta forma de descrição dos recursos pretende assegurar que os princípios FAIR são cumpridos, nomeadamente que as descrições são encontráveis, acessíveis, interoperáveis e reutilizáveis ao longo do tempo. Do ponto de vista da arquivística, há uma sobreposição de objetivos com a preservação digital, que inclui a garantia da autenticidade.
Assim, entendemos que seria interessante desdobrar os requisitos da autenticidade, sob uma perspetiva arquivística baseada na Ciência da Informação, a partir dos princípios diplomáticos, para depois averiguar se o “FAIR Accessor” os cumpria, estando este exercício sumariado na tabela em exibição.
Tabela 1 - Integração do FAIR Accessor e modelo de descrição arquivística.
Conceptual dimensions/subdimensions | FAIR Accessor alignments |
A. Authenticity | |
A1. Identity | Fair Accessor provides a proper and predictable place to include all relevant metadata. |
A2. Integrity | Fair Accessor provides a .xml distribution registry of all recorded alterations. |
B. Archival bond | Fair Accessor exhibits information on the resources it contains/is contained in. |
C. Permanent access | |
C1. Unique identifier | Fair Accessor is aligned with defining a unique and stable identifiable URL for each record that can serve as its access point. |
C2. Stable host location | Fair Accessor is aligned with assuring permanent link for the resources along time. |
C3. Interoperable formats | Fair Accessor is aligned with the use of specific technologies (TPF and RDF) or the use of the .xml format to store selected metadata. |
D. Access granularity | FAIR Accessor layers of data and metadata are independent. |
E. Economic | FAIR Accessor infrastructure is API-free. Potential costs must include training of human resources. |
Fonte: Pacheco, Freitas e Silva (2022).
Como se depreende, esta forma de descrição parece cumprir os vários requisitos conceituais para a autenticidade e, por isso, para o reforço da confiabilidade dos recursos. Esperamos que estes resultados instiguem a curiosidade, o debate e a exploração de metodologias para abordar o dificílimo problema da preservação digital da informação, que não tem uma única solução, mas várias, consoante os diferentes contextos dos diferentes atores.
Enquanto profissionais de informação, temos a responsabilidade de manter de forma duradoura e confiável os registos da atividade humana do presente, de modo a que, como expressa Luciana Duranti de forma bela, “today’s actions, thoughts, achievements and creations will have a future, and the future will have a memory” (DURANTI, 2007).
Para ler o artigo na íntegra acesse: PACHECO, A. P.; FREITAS, M. C. V.; SILVA, C. G. The FAIR Accessor and the authenticity of digital archival information. Transinformação, [S. l.], v. 34 , e210006, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2318-0889202234e210006. |
Referências
DURANTI, L.; BLANCHETTE, J. The authenticity of electronic records: the InterPARES approach. In: Proceedings of IS&T 2004 Archiving Conference. San Antonio, Texas: IS&T, 2004, p. 215–220.
DURANTI, L. Theoretical Elaborations into Archival Management in Canada (TEAM Canada): Implementing the theory of preservation of authentic records in digital systems in small and medium-sized archival organizations. InterPARES 3 Project, 2007.
LUSENET, Y. de; WINTERMANS, V. (Eds.). Preserving the digital heritage: principles and policies. The Hague: Netherlands National Commission for UNESCO, European Commission on Preservation and Access, 2007.
WILKINSON, M. et al. Interoperability and FAIRness through a novel combination of Web technologies. PeerJ Computer Science, [S. l.], v. 3e, n. 110, 2017.
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* Dados biográficos dos autores
André P. Pacheco é doutor em Ciência da Informação pela Universidade de Coimbra. E-mail: andrez.pacheco@gmail.com
Maria Cristina Vieira de Freitas é doutor em Ciência da Informação e da Documentação pela Universidade de Salamanca. https://orcid.org/0000-0002-8849-8792
Carlos Guardado da Silva é doutor em História Medieval pela Universidade de Lisboa e agregado em Ciência da Informação pela Universidade de Coimbra. https://orcid.org/0000-0003-1490-8709
Como citar
PACHECO, A. P.; FREITAS, M. C. V.; SILVA, C. G. De que forma o “FAIR Accessor” pode promover a autenticidade da informação arquivística digital?. Ciência da Informação Express, [S. l.], v. 3, n. 4, 5 maio 2022.
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